quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Justiça, ainda que tarde

Carlos Chagas
Já se encontra na mesa da presidente Dilma Rousseff, para sanção, projeto de lei aprovado semana passada no Congresso, concedendo ao  ex-vice-presidente  Pedro Aleixo o status de ex-presidente da República. Trata-se de uma reparação ao esbulho praticado contra ele em 1969, quando uma Junta Militar usurpou o poder,  impedindo a posse do vice-presidente diante do impedimento do presidente Costa e Silva, acometido por uma trombose cerebral.  Em vez de ocupar o palácio do Planalto,  Pedro Aleixo foi preso pelo almirante Augusto Rademaker, o general Lyra Tavares e o brigadeiro Marcio Mello.  Ficou impedido de deixar o apartamento da filha, no Rio, e mais tarde viu extinto seu cargo, por Ato Institucional assinado pelos ministros militares.
É a segunda vez que o Congresso dá a condição de presidente da República, com direito a inscrição nas galerias   da História, a quem não pode exercer o cargo. O primeiro foi Tancredo Neves, anos atrás, eleito mas não empossado por motivo de doença.
Em 1969 o  país vivia um de seus momentos mais baixos, explicando-se a usurpação pelo fato de que Pedro Aleixo convencera   Costa e Silva da necessidade de extinguir o Ato Institucional número 5 e reabrir o Congresso, então posto em recesso. Seria a constitucionalização, depois de sete  meses de exceção truculenta. O velho marechal-presidente concordara plenamente com seu vice, acentuando que não passaria à História como ditador,  como mais um militar que golpeara as instituições.   Estava disposto a enfrentar as resistências em seu próprio pano de fundo, mas não resistiu às pressões e caiu sem voz e sem  movimentos quando faltava uma semana para revogar a legislação ditatorial.
Pedro Aleixo havia sido a única voz dissidente, no governo, quando da assinatura do AI-5, pelo Conselho de Segurança Nacional. Todos os ministros optaram pela volta à ditadura dos tempos do ex-presidente Castello Branco.  Ao exprimir sua opinião, a 13 de dezembro de 1968, dada a agitação desenvolvida pelas esquerdas radicais, o vice-presidente optou pela decretação do Estado de Sítio, remédio constitucional para enfrentar crises institucionais. Foi interrompido pelo ministro da Justiça, Gama e Silva,  que  maliciosamente indagou “se ele desconfiava das mãos honradas do presidente Costa e Silva, a quem caberia aplicar o AI-5”. Como professor de democracia que era, Pedro Aleixo respondeu que das mãos honradas do presidente, jamais duvidaria, mas tinha  medo do guarda da esquina. Na hora da votação, Costa e Silva ainda pediu para  a argumentação de Aleixo ser  repetida, sinal de que resistia, mas adiantou pouco. Por unanimidade os ministros apoiaram a volta à exceção do período presidencial anterior,  sob o argumento de que Costa e Silva seria deposto pelos militares caso não cedesse.
Depois, foi o que se viu. Não apenas o guarda da esquina, mas montes de generais, coronéis e civis espertalhões usaram e abusaram do Ato, censurando, prendendo, legislando  e reprimindo a população, sem limites. Seis meses depois, em  maio de 1969,  Costa e Silva pede a Pedro Aleixo para conduzir o processo de volta à normalidade constitucional , o que é planejado em detalhes. Fixou-se o dia 7 de setembro para a assinatura da extinção do AI-5 e a reabertura do Congresso. Faltando uma semana, dá-se a tragédia.
Ao conduzir o vice-presidente à presença deles, os  ministros militares argumentam que o presidente Costa e Silva podia obrigá-los a aceitar o fim da exceção, como superior hierárquico,  mas ele não.  Assim, “assumiam” o governo e o poder. E ainda faltaram  com a verdade, dizendo que Costa e Silva havia concordado com a solução. Ora, naqueles dias  o presidente estava em estado de coma,  sem poder decidir coisa alguma.
Nada mais justo, assim, que a presidente Dilma sancione o projeto unanimente aprovado por senadores e deputados, concedendo postumamente  a Pedro Aleixo a condição de ex-presidente da República.
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NÃO DEMITE, MAS…
Quando a presidente Dilma Rousseff informa o PMDB e demais partidos da base oficial que  não pretende demitir mais ministros, está deixando algumas lacunas. Porque se vierem a público denúncias comprovadas e escabrosas de corrupção em outros ministérios, ninguém deve esperar que ela pretenda  encobri-los. A natureza seguirá seu curso. Da mesma forma, os partidos que apoiam seu governo foram e continuarão sendo chamados a  fazer indicações, mas não  detém o poder de manter ou afastar ministros.  Essa prerrogativa é dela.
Em suma, a disposição da presidente é de prestigiar os partidos, mas jamais de ser tutelada por eles.  Se precisar demitir, demitirá.
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DÚVIDAS MINEIRAS
Diz a Constituição no artigo 14, parágrafo 5,  que poderão  reeleger-se o presidente da República, os  governadores e os prefeitos, e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente. Isso significa que Antônio Anastasia, de Minas, não poderá reeleger-se em 2014? Porque, como vice-governador, ele sucedeu a Aécio Neves, que renunciou para candidatar-se ao Senado. Assim, o atual governador já exerceu o cargo no mandato anterior.  Concorrer outra vez não seria um terceiro período? Há controvérsias, mas para quem gosta de prospectar o futuro, eis aí uma questão fascinante.   Quem os tucanos mineiros dispõem como rexerva para disputar o palácio da Liberdade e enfrentar o ministro Fernando Pimentel, do PT, em  franca campanha? Deixando solto o cavalo branco da imaginação, por que não o  próprio Aécio Neves, caso o candidato à presidência da República, daqui a três anos,  venha a  ser o Lula?
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AGORA NÃO DÁ, MAS DEPOIS…
Assusta qualquer observador estrangeiro que venha ao Brasil o farto número de ministros  evoluindo em torno da presidente da República.  Serão 39, com a próxima criação do miniustério da Pequena e Média Empresa. Não só atribuições redundantes complicam o funcionamento da máquina, mas ambições partidárias, também.
Claro que a hora política seria até  mesmo da ampliação do número de ministérios, para satisfazer a goela aberta de quantos aderiram e estão por aderir ao governo. Mas a médio e longo prazo, porém, seria bom a presidente Dilma ir pensando numa ampla reforma administrativa, capaz de enxugar sua equipe de ministros. Não dá  para acompanhar 39 atividades e o mesmo número de susceptibilidades, complicações e interesses. Nem mesmo para saber o número e o nome dos filhos e netos dos ministros.
No passado, os ministros eram poucos, e quando começaram a crescer, quem tentou dar um   freio de arrumação foi Fernando Collor. Reduziu a administração federal a setores maiores, como infraestrutura, economia e questões sociais. Mas precisou dar o dito pelo não dito quando as coisas começaram a apertar para o lado dele, voltando a  recriar pastas suprimidas.

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